
História
Gichin Funakoshi (1868–1957): O Pai do Karate Moderno
A trajetória de Gichin Funakoshi está intrinsecamente ligada à história do Karate. Seu legado o consagrou como o "Pai do Karate Moderno", título que reflete sua dedicação em transformar e divulgar essa arte marcial para o mundo.
Infância e os Primeiros Passos no Karate
Nascido em 1868, em Shuri, Okinawa, no mesmo ano da Restauração Meiji, Funakoshi cresceu sob os cuidados dos avós maternos, recebendo uma educação tradicional que incluía o estudo da poesia clássica chinesa. Na escola primária, fez amizade com o filho de Yasutsune Azato, renomado mestre de Karate e membro de uma família influente. Por intermédio dessa amizade, Funakoshi iniciou seus treinos no quintal de Azato, em horários noturnos, devido à proibição da prática de artes marciais na época.
Sob a orientação rígida de Azato e de seu amigo, o mestre Itosu, Funakoshi mergulhou na filosofia "Hito Kata San Nen" ("um kata em três anos"), que valorizava a repetição e o aprendizado profundo de cada movimento. O treinamento, embora exaustivo, fortaleceu sua saúde frágil e consolidou sua paixão pelo Karate.
A Introdução do Karate nas Escolas de Okinawa
Em 1902, uma demonstração liderada por Funakoshi impressionou o inspetor escolar Shintaro Ogawa, que recomendou ao Ministério da Educação a inclusão do Karate nas escolas. Com o apoio de Itosu, Funakoshi adaptou o ensino do Karate para as aulas de Educação Física, introduzindo os kata às crianças de Okinawa. Esse passo foi crucial para desmistificar a arte e integrá-la ao cotidiano.
A Difusão do Karate no Japão
Em 1921, o príncipe herdeiro Hirohito assistiu a uma demonstração de Funakoshi em Okinawa, impressionando-se com a arte. No mesmo ano, Funakoshi foi convidado a apresentá-la em Tóquio, onde o sucesso foi imediato. Embora planejasse retornar a Okinawa, decidiu permanecer no Japão para atender à crescente demanda por seus ensinamentos.
Com o apoio de Jigoro Kano, fundador do Judô, Funakoshi encontrou oportunidades para divulgar o Karate entre as elites japonesas. Ele fundou seu primeiro dojo, o Meisei Juku, e publicou, em 1922, seu primeiro livro, Ryukyu Kenpo Karate, introduzindo o Karate aos japoneses e promovendo seu desenvolvimento técnico e filosófico.
Reformas e Consolidação do Karate
Na década de 1930, Funakoshi promoveu mudanças significativas no Karate. Ele substituiu o caractere "Kara" (China) por "Kara" (vazio), redefinindo o significado de "mãos chinesas" para "mãos vazias". Essa alteração visava não apenas a popularidade da arte no Japão, mas também o alinhamento com os valores espirituais do Karate, que pregam o desapego e a simplicidade.
Além disso, Funakoshi introduziu exercícios de combate, como o kumite, tornando o Karate mais dinâmico e acessível. Ele também revisou os nomes dos kata, aproximando-os da língua japonesa para facilitar sua aceitação nacional.
Em 1939, aos 71 anos, Funakoshi inaugurou o Shotokan, dojo cujo nome homenageava seu pseudônimo artístico e sua conexão com a natureza.
Impactos da Segunda Guerra Mundial
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Karate ganhou destaque entre os jovens que buscavam treinamento para enfrentar o recrutamento militar. No entanto, o conflito trouxe destruição ao Japão e ao Shotokan. Funakoshi perdeu familiares, alunos e seu dojo, além de testemunhar a devastação causada pelos bombardeios americanos.
Após a guerra, com a ocupação americana, as artes marciais foram inicialmente proibidas, mas a insistência de seus alunos conseguiu reabilitar o Karate, agora apresentado como um esporte.
Legado e Lições
Em 1949, foi criada a Associação Japonesa de Karate (Nihon Karate Kyokai), consolidando o Karate como uma disciplina organizada. Até sua morte, em 1957, Funakoshi manteve seu compromisso com o ensino do Karate como um caminho para o desenvolvimento do caráter.
Seu epitáfio, "Karate Ni Sente Nashi" ("No Karate, não existe ataque primeiro"), resume sua visão pacifista e filosófica. Gichin Funakoshi não apenas transformou o Karate em um fenômeno global, mas também personificou seus princípios, deixando uma lição de humildade, resiliência e respeito que transcende gerações.
Conclusão
Gichin Funakoshi enfrentou adversidades pessoais e históricas para levar o Karate de Okinawa ao Japão e, posteriormente, ao mundo. Seu legado permanece vivo, não apenas como o fundador do Karate Moderno, mas como um exemplo de que a força verdadeira reside no caráter e na perseverança.
